Retrato
aqui um dos bens de cultura imaterial, um dos que temos de mais rico na região
nordeste, bens estes que dizem respeito às práticas e domínios da vida social
que se manifestam em saberes, celebrações, modos de fazer, formas de expressão
cênica, plásticas, musicais ou lúdicas, assim também como nos lugares, as
práticas culturais coletivas.
A
literatura de cordel enraíza no cotidiano a história, a memória regional e
nacional, a identidade e a formação da sociedade brasileira. É assim que
comento a literatura de cordel de Sebastião Alves Lourenço, conhecido como
Sebastião Chicute, mestre nas categorias de cordel e reisado. Nasceu no
município de Aratuba-Ce, em 1934, e desde a infância se dedica à literatura de
cordel. Faz seu primeiro cordel para o comércio de venda no ano de 1967. Já em
1970 muda-se para outro município, Capistrano, onde diversifica seus trabalhos
no campo cultural. Em 2006 recebe o diploma de Mestre da Cultura Popular
Brasileira do Estado do Ceará.
A
literatura de Sebastião Chicute no cordel ‘’Os
primeiros Escravos no Ceará –Abolição 1884’’ nos traz a preocupação do
autor com a inspiração divina que lhe presentearia com o dom poético para
escrever seu trabalho. Além da escravidão dos negros, também retrata o trabalho
escravo feito por indígenas, ‘’e sendo os primeiros escravos/ por caboclos eram
chamados’’. Falou também da proteção que a igreja dava a regime de escravidão
com os padres jesuítas que catequizavam os índios em nome de da ‘’ordem
social’’. Mostra o aumento populacional no interior do Ceará, ‘’claro que tinha
que aumentar/ quase trinta mil escravos/ somente para trabalhar’’, fala da
relação entre tráfico negreiro e o crescimento populacional na segunda metade
do século XIX, chegando à metade dos habitantes serem escravos que trabalhavam
com os serviços mais pesados. Lembra também de José Martiliano, pai de José de
Alencar, e sua preocupação em amenizar o sofrimento dos escravos. Fala da
cooperativa fundada por dez moças ao final de 1880 que destinavam os lucros
para a alforria de escravos, uma ‘’entidade solidária’’ onde os trabalhos
realizados em prol da alforria eram apenas do conhecimento de poucos. Fala dos
revolucionários em prol da liberdade, da alegria das batalhas e da felicidade
ao fim da escravidão. É bonito ver a lembrança que o autor faz a justa
importância das mulheres na causa abolicionista, ainda pouco vista nos livros
de história. Nos traz a lembrança os cativos do Acarape, que tem sua liberdade
no dia 1º de janeiro de 1883, com a presença de ilustres abolicionistas, mas
alfineta, e fala da desunião do município de Acarape com sua nova divisão, onde
parte da região passa a se chamar Redenção, em lembrança a liberdade dos
escravos que viviam ali. Passa por outras cidades citando as vitórias
abolicionistas além de Fortaleza, como Sobral, Trairi, Pacatuba, Santa
Quitéria, Camocim, Morada Nova entre outras, ‘’foi caindo um por um/ e
fazendeiro achando ruim’’. O município de Fortaleza não deveria esquecer jamais dos trabalhos
desumanos, assim diziam os discursos após o fim da escravidão, ‘’parabéns
abolição’’, finaliza o cordel lembrando da abolição ‘’somente assinada/ em
forma d edital’’, no dia 13 de maio de 1888 pela princesa do Brasil, Princesa
Isabel.
Reconhecer
a importância do cordel como parte do nosso patrimônio cultural é reconhecer a
nossa cultura lembrada nos versos de cordelistas como Sebastião Chicute que nos
traz com riqueza de informações um momento tão importante para a história da
abolição dos escravos do Ceará. É a literatura popular, hoje reconhecida, que
traz parte da cultura nordestina e brasileira que além de nos proporcionar
conhecimento, nos desperta o interesse pela leitura. Interesse este que fez
surgir no nordeste poetas de expressão como Patativa do Assaré e nos revela a
riqueza musical de Luiz Gonzaga, que sintetiza a grandeza da arte popular
nordestina.
* Aluna do Curso de História da UECE, disciplina AÇÃO EDUCATIVA PATRIMONIAL, Prof. FRANCISCO ARTUR PINHEIRO ALVES.
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